Discursos

Olívio Martins de Souza Torres

Titular da Cadeira nº 8

 

Apresentação do livro TRAVESSIA

Minha Senhoras,

Meus Senhores,

Boa noite!

Em sendo mais fácil e melhor ler do que ouvir, principalmente depois da faina diária de muitos aqui presentes, vou tentar ser o mais breve possível, como é, hodiernamente, recomendado nos discursos e nas apresentações.

Com efeito, a Bíblia já recomendava: “Sê breve em teu discurso, dize-o muito em poucas palavras. A Escolástica também preceituava a brevidade quando ensinava: “Esto brevis et placebis”, i.e. : “Sê breve e agradarás”. Em Dom Quixote, escreve Cervantes, um dos maiores gênios da literatura universal: ”Sé breve en tus razonamientos, que ninguno hay gustoso si es largo”, ou seja, “Sê  breve em teus raciocínios, que a ninguém agrada seres longo”.

Diante dessas recomendações, tenho a obrigação de ser breve, tanto quanto possível, na apresentação do livro TRAVESSIA, de Maria de Jesus Dias Xerez, conhecida entre os amigos como Ju Ju Dias.

Nada obstante, estou enfrentando um duplo desafio. Primeiro, o de ser breve. Segundo, o de apresentar o livro de uma poetisa, pois, segundo Olavo Bilac, “um poeta deve ser apresentado por outro poeta ou por um crítico literário”. Não sou nem um nem outro.  O aforismo latino é taxativo: “Poeta non fit, sed nascitur”, “o poeta não se faz, nasce”.

A poesia de Ju Ju Dias permeia os sentimentos que povoam a misteriosa e insondável alma humana. Eles se voltam ao mundo interior, onde residem os sonhos, as esperanças, os devaneios, os contrastes e os confrontos da vida. Resgatam a subjetividade entre o mundo e a alma, permitindo sugerir o movimento e o efêmero da emoção.

Em versos livres, na rota do modernismo introduzido no Brasil na Semana da Arte Moderna, de 1922, no entanto a forma poética cultivada predominante é o simbolismo, de ideias abstratas, emoção lírica vivida intensamente no momento da criação. A autora é profunda conhecedora da corrente simbolista da literatura brasileira de Cruz e Sousa, Raul de Leoni, Da Costa e Silva, e de outros.

Também há poemas de cunho romântico, fruto da leitura de poetas do romantismo brasileiro da estirpe de Gonçalves Dias, Casemiro de Abreu e Fagundes Varela.

Em TRAVESSIA percebe-se também a influência do parnasianismo, com rimas internas em muitos versos, figuras de linguagem, efeitos sonoros e visuais, fruto também do seu conhecimento dos poetas parnasianos Olavo Bilac, Raimundo Correia, Alberto de Oliveira, Vicente de Carvalho, dentre outros.

A beleza da poesia de Ju Ju Dias é resultante do desejo, do esforço beneditino empreendido em sua composição, e não somente da inspiração. Há expiração e inspiração na feitura de seus belos versos. Observa-se a riqueza imagética nas cores, nos movimentos e nos sons das palavras, proporcionando concretude ao mundo criado.

Quero, no momento, fazer uma referência ao bem escrito prefácio do livro, de autoria de Maria Iraci Filizola Rocha, o qual me auxiliou na elaboração desta apresentação.

Outrossim, cabe-me relatar que a primeira poesia que chegou às mãos de Ju Ju Dias foi de autoria de Antônia Araújo Martins, conhecida como Dona Selva, que, nas palavras da autora, tinha uma grande sensibilidade e aclamava sempre o amor e a saudade, amando as flores, as plantas, a natureza e a vida.

Ju Ju Dias tinha tudo para amar as letras, pois, desde a infância, foi estimulada e alimentada sempre pelo prazer da leitura de sua mãe, D.ª Maria das Dores, e de sua avó, D.ª Matilde Serra Dias, a quem presta homenagem especial no seu livro TRAVESSIA. A autora homenageia também a prefaciadora do livro, poetisa Maria Iraci Filizola Rocha, inserindo nele o poema dela intitulado “Além”.

Ressalto, com grande alegria, a bela homenagem que a poetisa faz a D.ª Valdemira Coelho, a qual, por coincidência, foi também minha professora e adorada mestra.

Minhas Senhoras,

Meus Senhores,

Peço-lhes permissão para fazer uma pequena digressão no que concerne à poesia e ao poeta.

O que dizer da poesia? Como não sou poeta, mas desejaria sê-lo, exponho-lhes as opiniões de quem entende de poesia.

Qual o significado da poesia, o seu valor intrínseco, e como pode ser definida? O poeta brasileiro Ferreira Gullar definiu-a como “uma luz do chão”. Emesto Fraeri considera a poesia como “atividade imediata da natureza criativa do homem, que plasma incessantemente o próprio mundo”. O poeta francês Paul Valéry assim se expressa: “ ... en poésie, il s’agit, avant tout, de faire de la musique avec sa douleur, laquelle directement n’importe pas” (“... em poesia, trata-se, antes de mais nada, de fazer música com a própria dor, a qual diretamente não importa”). John Keats, o último poeta romântico inglês, em Sono Poesia, afirma: “The great end / Of poesy, that it should be a friend/ To sooth the cares, and lift the toughts of man” (“O grande alvo / Da poesia é ser um amigo/ É mitigar as ansiedades e levantar os pensamentos do homem”).

E o que dizer do poeta? Da mesma forma, passo a palavra aos poetas.

Fernando Pessoa, poeta português de renome internacional, qualifica assim o poeta: “O poeta é um fingidor. / Finge tão completamente / Que chega a fingir que é a dor / A dor que deveras sente”. Mário Quintana, em Caderno H, assim se expressa: “Ser poeta não é dizer grandes coisas, mas ter uma voz reconhecida dentre todas as outras”. Goethe, o grande dramaturgo e poeta alemão, em Poemas, fala sobre os poetas: “Dichter lieben nicht zu schweigen, / Wollen sich der Menge zeigen. / Lob und Tadel muss ja sein! / Niemand beichtet gern in prosa; / Doch vertrauen wir oft sub rosa. / In der Musen stillem Hain.” ( “Poetas não podem calar-se , / Querem às turbas mostrar-se. / Há de haver louvores, censuras! / Mas abrimo-nos sub rosa / No calmo bosque das musas”.)  Em Antologia, José Albano escreve: “Poeta fui e do áspero destino / Senti bem cedo a mão pesada e dura, / Conheci mais tristeza que ventura / E sempre andei errante peregrino.”)

Não vou comentar as poesias de Ju Ju Dias (cabe ao leitor fazê-lo) inseridas neste bem feito livro TRAVESSIA, que é a sua travessia para a imortalidade do mundo encantado, mágico e feérico das letras. Isto também para não tirar de vocês a ânsia e a curiosidade de lê-lo, como o fiz de um só fôlego.

Permitam-me somente fazer referências a duas poesias. A CASCATA NUA me lembra o lugar em que a bela índia guerreira Iracema se banhava, nua, e onde houve o encontro com o guerreiro branco Martim, que a observava.  A Bica do Ipu (Fall of Ipu) é o nosso maior ícone e consta de selo dos Correios, de circulação nacional e internacional, lançado em 2013, que percorreu o mundo inteiro, mostrando-lhe as belezas de nossa querida terra. O poema RUA DA ITÁLIA me traz gratas recordações, pois foi lá que nasci e passei a minha doce e feliz infância.

Vou ficando por aqui, mas devo frisar que Ju Ju Dias é um poço inesgotável de inspiração poética, donde brotarão, em breve, muitos outros livros de poesia para alegria e deleite de todos nós.

Muito obrigado!

Olívio Martins de Souza Torres

Ipu, 17 de janeiro de 2019

 

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