Crônicas

Titular da Cadeira Nº 34

            No meu tempo, quem tinha o nome de Francisco José, chamávamos de Franze. Nos anos quarenta não sei como era, sei que Franze é o hipocorístico de Francisco José. No entanto, estou falando de um padre. Conheço Padre Francisco e os mais íntimos o chamam de Padre Chico. Francisco, Chico, Chiquinho são chamamentos carinhosos e familiares. Reservado ao mundo de casa e dos amigos.

            Pois bem, Franze foi para o seminário. É, naqueles anos eram seminários, hoje, casas de formação. Mudaram-se os hábitos, no entanto a essência é a mesma, formam padres, homens do dom do sacerdócio. No dizer da grande Rachel em “os dois bonitos e os dois feios” (uma das cem melhores crônicas brasileiras), “estou feliz em ser a última das últimas. Nunca se sabe direito a razão de um amor”. Fato é que Franze quis ser padre. Seu pai, homem arguto, não envidou esforços para matriculá-lo no Seminário. Na família já havia outro padre e doutor.

            Foi Franze estudar no Seminário de Sobral, curso menor. O maior foi fazê-lo em São Paulo e o pai investindo. Mas não é que o investimento deu certo! Francisco José ordenou-se padre em sua querida cidade. Primeira ordenação sacerdotal sob os auspícios de São Sebastião. Pois o Padre Aragão foi velado e auspiciosamente encomendado na mesma paróquia de São Sebastião, padroeiro de Franze, o menino bem educado por sua mãe, por seu pai.

            Acabou? “Deus trás os bonitos de baixo da sua Mão”, já dizia Queiroz, lucidamente na sua crônica. Franze tornou-se padre e ficou conhecido como Pe. Aragão. Muito formal para mim. Melhor seria Padre Franze. Imaginem vocês a diferença entre Pe. Aragão e Pe. Franze. Aragão. Nome cheio. E agora? Pe. Franze, hipocorístico, leve, caseiro quase que ternurento.

            E o Pe. Francisco José estudou Latim. As missas deveriam ser rezadas em Latim. Língua difícil. Também estudei latim. Mas no Curso de Letras. E foi o meu calo. Ah línguazinha difícil. No meio do caminho Pe. Aragão não precisou mais do Latim. Por quê? Iam-se os anos do Concílio Vaticano II. Hoje São João XXIII mas em 1963 Papa acatando a decisão do Concílio determinou que as missas não seriam mais rezadas em Latim e sim na língua pátria de cada pais. E Pe. Aragão vira Pe. Franze, claro, deveria estar perto do seu rebanho. Mas Pe. Aragão não perdeu a elegância latina. Rezava a missa em bom português mas era efetivamente Pe. Franze. Hoje sou amigo do Pe. Chico, como ele mesmo se intitula, um padre do interior. Mas sabe como ninguém chegar ao povo, ser um missionário, assim como Pe. Franze realizou esta aproximação.

            Pe.. Franze foi um missionário. Embora hierático e fidalgo atingiu o  povo. Batizou e casou não sei quantos milheiros de pagãos e fieis. Eu fui um casado por ele. Bem que eu queria ter chamado-o de Pe. Franze, mas aquele tempo era mesmo Pe. Aragão. Ele se orgulhava e até diria se ufanava em ser chamado de Pe. Aragão. Tinha orgulho de sua estirpe. Tinha orgulho em ser ipuense, mero aspecto geográfico, pois sua essência era e esta no Ipu.

            Chegou ao posto Cônego, mas se considerava Padre inteligentemente, pois para se chegar a Cônego a condição inicial é ser padre. E ele era um padre por vocação, por escolha.  

            Foi o Pe. Aragão ou na minha cabeça o Pe. Franze, efetivamente um sacerdote. Sabem o significado de sacerdote? Pois sei que sabem. É aquele que recebe as ordens sacerdotais e que ministra os sacramentos da igreja. É efetivamente um ministro que age como mediador entre o homem e Deus. Vem do latim: Sacerdos, aquele que é o representante sagrado. Uma autoridade verdadeira. Um crente fervoroso. Um homem que se ocupa do estudo de Deus, de sua natureza e seus atributos e de suas relações com  o homem. Um escolhido. Mas, para mim, nem por isso deixaria de chamá-lo de Pe. Franze. Que bom seria se tivesse tido esta experiência mesmo sendo bem mais novo que ele.

            Pe. Aragão, Cônego Aragão, desculpem-me minha afetividade, Pe. Franze, o meu obrigado, respeito e admiração, ainda que tarde, ou cedo? Nutro grande respeito e profunda admiração pelo Pe. Chico da Diocese de Cajazeiras, desculpe-me Pe. Francisco por usar seu hipocorístico e pelo Pe. Aragão que já esta em outra dimensão. Para mim estes dois sacerdotes são Pe. Chico e Pe. Franze. Cônego Aragão meu Patrono na Academia Ipuense de Letra, Ciências e Artes é meu modelo, mas no âmago do meu coração será sempre Pe. Franze.

Coco - 03/04/2018

Nota: Este ano, dia 20 de setembro próximo  se vivo fosse Pe. Aragão completaria 80 anos. Vai minha homenagem ao Patrono da Cadeira Nº 34 da Academia Ipuense de Letras, Ciências e Artes. Dia 16 de abril último houve encontro no céu, seu irmão Antônio Humberto Aragão e Silva, para nós Bertim, cumpriu sua missão na terra. Antônio Humberto Aragão e Silva é um dos fundadores da Academia Ipuense de Letras, Ciências e Artes, conforme art. 27 do Estatuto da Academia. A ele minha homenagem por meio desta crônica.

Mais artigos do Autor.