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Maria de Lourdes Dias Leite Barbosa

 

Além, muito além daquela serra que ainda azula no horizonte, nasceu nossa homenageada. Não corria o sertão e as matas do Ipu, porque matas não mais havia, os herdeiros de Iracema e Martim tinham plantado em seu lugar uma bela cidade. Coisas do progresso! Mas a menina viva e curiosa percorria as ruas calçadas de pedra, ensombradas por mongubeiras e tamarineiros: o Quadro da Igrejinha, a Rua Verde, a Rua da Itália.

O que mais a encantava era poder contemplar, onde quer que estivesse, o belo espetáculo da queda das águas, que saltavam do alto da serra e vinham morrer nos arredores da cidade. Eram as mesmas águas que formavam o riacho Ipuçaba, que contornava quintais e permitia à garotada os banhos guardados na memória. Foi nessas andanças que nossa heroína fez sua primeira leitura de mundo. Mais tarde, a professora Carmosa, misto de mãe carinhosa e mestra exigente, abriu-lhe as portas do universo da escrita e, de repente, a menina viu-se envolvida por novas e misteriosas palavras que enriqueciam seu espírito e alargavam seu universo. O próximo passo, em busca do saber, levou-a à escola do renomado professor Antônio Marrocos, um estabelecimento de ensino moderno, avançado para os padrões da época, onde fez o curso primário.

Nas horas de folga, os jovens, ávidos por conhecimento, faziam da biblioteca do Grêmio Literário Ipuense seu ponto de encontro e, na saída, paravam na casa do Dr. Thomaz Correia, boticário e homem culto, que lhes ensinava a solfejar. Os tempos eram outros!

Muitas luas tinham alumiado o céu, quando a menina-moça viu que era chegada a hora de deixar sua terra e viajar para a capital, onde devia completar seus estudos, como se costumava fazer, assim, matriculou-se no Colégio da Imaculada Conceição, em cujo internato, permaneceu durante seis anos. Foi uma longa aprendizagem, porém seu espírito indomável sonhava com voos mais altos, e a moça decidiu fazer o Curso de Pedagogia na Escola Normal, instituição que tinha como mestres as mentes mais brilhantes da educação no Ceará. Ao final do curso, recebeu a recompensa: foi a primeira colocada.

Havia uma promessa, por parte das autoridades governamentais, de que as três primeiras colocadas receberiam como prêmio um emprego público. Qual não foi a decepção de nossa jovem professora, ao constatar que a promessa não se cumprira; as companheiras que tinham obtido a segunda e terceira colocação estavam empregadas, porém ela, a primeira colocada, não conseguira o almejado prêmio.

A justiça veio em forma de um convite do ex-professor Filgueiras Lima. Ele e Paulo Sarasate estavam inaugurando o Colégio Lourenço Filho e convidaram-na para compor seu quadro de professores, entre os quais estavam as melhores alunas da Escola Normal. Assim, durante muitos anos, nossa homenageada contribuiu para o sucesso dessa reconhecida instituição.

O casamento e os filhos a afastaram, por um curto período, de sua profissão, mas um concurso para Técnico de Educação a trouxe de volta à arena. Lotada na Secretaria de Educação do Estado, pediu transferência para trabalhar na Escola Normal, sua antiga casa. Por volta de 1954, foi aprovada em um concurso para professora e passou a ministrar as disciplinas Prática de Ensino e Didática.

Nossa homenageada é Suzana Dias Ribeiro, uma das quatro fundadoras da Sociedade das Amigas do Livro, mulheres conscientes e destemidas, que, em 1961, decidiram trabalhar pela cultura do Ceará, participando de simpósios, congressos, promovendo palestras, doando bibliotecas, apoiando, enfim, os movimentos literários.

Suas companheiras da SAL agradecem-lhe pelas lições de vida, pela capacidade de doar-se, pela luta em prol da cultura, por ter contribuído para a melhoria da educação em nosso Estado.

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