Crônicas

Titular da Cadeira Nº 34 - Patrono: Cônego Francisco José Aragão e Silva

 

            Pedro Henrique, “o meu coração”, andou aqui. Meu doce de leite esta bem pouquinho. Preciso situar o leitor. Nasci em uma família que tinha uma fazenda no semi-árido tórrido do Tamboril, no Ceará. Campo Nobre. Lugar abençoado que produzia muito feijão verde no inverno.

            Parecido com a sociedade medieval, nosso pai nos levava a fazenda, anualmente, de maio a julho, quadra invernosa e de muita fartura. Ia conosco uma professora que nos dava aulas e em agosto, quando retornávamos ao Ipu, fazíamos as provas para acompanhar o ano letivo. Idade Média no Ceará nos anos 60. Latifúndio? Não sei. Sei que nestes períodos comíamos muito feijão verde com maxixe, quiabo, manteiga da terra e queijo coalho. Ah! Nunca mais senti aquele gosto do queijo coalho, feito com coalho natural pela minha mãe e que rangia no dente.  

            Hoje como queijo de coalho feito com coalho químico e parece bom, não excelente como os de criança. Campo Nobre! Nas sobremesas sempre havia doce do mais puro leite, também feito por minha mãe, acompanhado do queijo.

            Fato é que, cresci vim pra cidade grande e continuei comprando no mercantil (cearense compra no mercantil e não no mercado, por razões culturais) o queijo de coalho e o doce de leite. Ah! No feijão verde acrescentam-se maxixe e quiabo. Era temperado com a mais pura nata, também feita por minha mãe.

            Continuo fazendo tudo isso, com uma pequena diferença. Nada mais é feito por minha mãe. Mas busco encontrar aquele sabor, que é impossível de sentir.  Pois bem, meu filho do meio o “meu coração” sem que eu saiba explicar o por quê, tem imensa predileção por feijão verde com nata, maxixe, quiabo, manteiga da terra e queijo de coalho e também o doce de leite. Garanto-lhes que nunca contei pra ele que tudo isso era feito por minha mãe e que eu trouxe este hábito para nossa casa. Mas, não sei explicar ele também tem bom gosto!

            Uma das minhas grandes alegrias nestes tempos é que ele me agradece muito quando faço o feijão verde temperado com nata todo cobertinho de tempero verde. A diferença do tempero verde, os de minha mãe eram colhidos no jirau do fundo de casa, os que eu faço comprados no mercantil.

            Pior, ou melhor, é fato que Pedro Henrique aprecia muito estes pratos. Imaginem se ele tivesse degustado aqueles feijões verdes feitos por sua avó e com todos os ingredientes orgânicos, como se diz hoje.

            Detalhe é que em minha geladeira quando o doce de leite baixa muito de nível é porque ele encontrou o que não estava perdido. Que bom! Que maravilha! Os valores são passados, tranquilamente, sem pressa, sem angustia. Nunca tinha contado isso a meu filho. Isso é viver! Agora vou degustar meu doce de leite com queijo de coalho. Não mais aqueles feitos por minha mãe, mas... industrializados lembram vagamente aqueles! Afinal não podemos ter tudo o que queremos na vida!

          Hum!!!

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