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Cadeira nº 34

Autor: Acadêmico José Solon Sales e Silva, ocupante da Cadeira Nº 34

Nos anos trinta do século XX, em Ipu, aconteceu o casamento da ipuense Anisia Aragão com o reriutabano Antônio Cícero e Silva. Deste casamento nasceram dois filhos, Francisco José Aragão e Silva e Antônio Humberto Aragão e Silva. Dona Anísia, descente de família com forte formação religiosa, educa os filhos na mais rigorosa tradição cristã. 

Ao engravidar do segundo filho, o casal Silva resolve que este deveria nascer em Fortaleza, considerando-se que aquela época os recursos clínicos em Ipu eram praticamente inexistentes. Desta forma Francisco José nasce em Fortaleza aos 20 de setembro de 1938. Como era da tradição o recém nascido batizava-se o mais cedo possível e este aconteceu na Catedral de São José, em Fortaleza, tendo o sacramento sido oficializado pelo Monsenhor Luis de Carvalho Rocha.

O pequeno Francisco José é afeito a ritualística religiosa desde muito cedo. Há registro fotográfico dos dois irmãos, onde ele com aproximadamente sete anos, aparece com um terço a mão. 

Aos vinte e dois anos, em 01 de agosto de 1950 ingressa no Seminário Menor de Sobral, idade já considerada avançada, aquela época, para o inicio da vida religiosa. O Seminário Maior cursou em São Paulo, no Seminário Central da Imaculada Conceição, um dos seminários mais antigos do Brasil. O fato da mudança para São Paulo, explica-se pelo motivo de que nos anos cinquenta Sobral não contava com o Seminário Maior, sendo necessária a transferência para outros seminários.

Apesar da Diocese de São Paulo ter sido criada em 1745 pela Bula Papal Condor Lucis Aeternae somente em 1853 na gestão do Bispo Dom Antônio Joaquim de Mello é lançada a pedra fundamental do primeiro seminário para o clero diocesano de São Paulo. Na gestão de Dom Duarte Leopoldo da Silva, primeiro Arcebispo de São Paulo o Seminário da Luz é transformado em Seminário Central da Imaculada Conceição do Ipiranga, elevando-o a dignidade de Seminário Provincial que levaria a receber seminaristas para formação de todo o Brasil.

Os sacramentos sacerdotais recebeu-os em Sobral e Ipu. Consta do Livro de Registro de Ordenações da Cúria Diocesana de Sobral, com termo de abertura assinado por D. José Tupinambá da Frota, em 16 de agosto de 1916, registro nº 125 à página 125: “Francisco José Aragão e Silva filho legítimo de Antônio Cícero e Silva e de Anísia Aragão e Silva, nascido na parochia de Ipu a vinte de setembro de mil novecentos e trinta e oito [...]. Recebeu a Primeira Tonsura Clerical das mãos do Exmo. e Revmo. Senhor Dom João José da Mota e Albuquerque a oito de fevereiro de mil novecentos e sessenta e dois. Recebeu as Ordens Menores do Ostiariado e Leitorado das mãos do Exmo. e Revmo. Senhor Dom João José da Mota e Albuquerque a seis de janeiro de mil novecentos e sessenta e três [...]. Recebeu o Presbyterado das mãos do Exmo. e Revmo. Senhor Dom Antônio Batista Fragoso (bispo de Crateús) na Matriz de Ipu com autorização do Vigário Capitular Mons. Joaquim Arnóbio de Andrade a dez de janeiro de mil novecentos e sessenta e cinco. Observação: Faleceu no dia 12 de junho de 2004 na Santa Casa de Sobral. Foi sepultado no Cemitério São João Batista, em Ipu, no dia 13/06/04 as 16:00 h.” 

Da leitura da ata acima se elaborou o quadro abaixo, que mostra o recebimento dos sacramentos clericais.

1ª TONSURA CLERICAL OSTIARIADO E LEITORADO PRESBITERADO

Em 08 de Fevereiro de 1962

Ministrante: D. João José da Mota e Albuquerque.

Em 06 de Janeiro de 1963

Ministrante: D. João José da Mota e Albuquerque.

Em 10 de Janeiro de 1965

Ministrante: D. Antônio Batista Fragoso.

Na Capela do Palácio Episcopal de Sobral, Ceará.

Igreja Matriz de Jesus, Maria, José de Poranga, Ceará.

Igreja Matriz de São Sebastião de Ipu, Ceará.

Fonte: adaptado pelo autor, das atas dos Livro de Registros de Ordenações da Cúria de Sobral (2011)

Fato curioso é que o Cônego Francisco José Aragão e Silva foi o primeiro padre a ordenar-se na Igreja Matriz de São Sebastião de Ipu. Eclesiasticamente a Paróquia de Ipu esta subordinada a Diocese de Sobral. No entanto a ordenação sacerdotal foi ministrada pelo Bispo da Diocese de Cratéus, D. Antônio Batista Fragoso. 

Entre os anos de 1964 e 1965 a Diocese de Sobral encontrava-se na condição de sede vacante, pelo fato de Dom João José da Mota e Albuquerque, ter sido nomeado Arcebispo de São Luis do Maranhão em 28 de abril de 1964, tomando posse daquela Arquidiocese em 15 de junho de 1964. Dom Mota fora nomeado para Bispo de Sobral em 28 de fevereiro de 1961. A Diocese de Sobral ficou vacante até 6 de janeiro de 1965 com a nomeação de Dom Walfrido Teixeira Vieira que tomou posse em 19 de março do mesmo ano. Por esta razão o Padre Francisco José Aragão e Silva foi ordenado por Dom Fragoso, Bispo de Cratéus, Ceará.

Relativamente à formação curricular, o Padre Francisco José era Licenciado em Teologia e Pedagogia com especialização em Administração Escolar e Dinâmica de Grupo Aplicada a Didática, nos estudos avançados fez Mestrado em Teologia.

Nomeado Pároco de Nossa Senhora de Santana do Acaraú, em 01 de agosto de 1965, por provisão do Bispo Dom Walfrido Teixeira Vieira, naquela cidade exerceu seu pastoreio até o final de sua vida sacerdotal. Em Santana do Acaraú contribuiu sobremaneira para a comunidade, destacando-se em sua atuação pastoral como educador,  fundador do Colégio Municipal João Cordeiro de onde foi o seu primeiro Diretor. Como contribuição social conseguiu a construção do Conjunto Habitacional Dona Luiza Távora, com cem casas para a polução de baixa renda. O Padre Aragão era amigo pessoal de D. Luiza e com ela, através da Secretaria de Ação Social, conseguiu a construção do conjunto habitacional, dando o seu nome em sinal de reconhecimento pelo empenho desprendido politicamente para tal construção.

Ainda como professor teve uma atuação profícua no magistério, tendo sido professor do Centro Municipal Santanense, escola da CNEC (Campanha Nacional do Ensino a Comunidade). Também foi diretor  da escola Nazaré Severiano. Nos anos 70 foi Presidente da Comissão Municipal do Mobral (movimento de alfabetização para adultos), de vez que, como pedagogo, era um entusiasta do programa de alfabetização para adultos. Na área do ensino superior foi professor de religião da então Faculdade de Filosofia, de Sobral, hoje Universidade Vale do Acaraú. Contribui sobremaneira para a educação do santanense tendo chegando a ocupar a pasta da Secretaria de Educação do município de Santana do Acaraú. 

Em vida recebeu várias honrarias, dentre elas a de maior destaque é o título de Cônego, concedido pelo Bispo Dom Walfrido Teixeira Vieira, de quem foi grande amigo.  Os Cônegos, reunidos formam um cabido, uma espécie de senado do Bispo, que os escuta nos momentos de decisões da Diocese. Originalmente este título de honra é reservado aos sacerdotes eleitos pelo Bispo para compor este senado eclesiástico. Da Câmara Municipal de Santana do Acaraú recebeu o Título de Cidadão Santanense. Após sua morte, em 2007, a Academia Ipuense de Letras, Ciências e Artes, o homenageia como Patrono da Cadeira Nº 34, perpetuando, justamente, a memoria deste sacerdote que tanto amou a terra de Iracema fazendo jus a cultura desta cidade profícua nas letras e artes. 

Por problemas de saúde tornou-se Pároco Emérito de Santana do Acaraú, por provisão de Dom Aldo de Cillo Pagoto e ali permaneceu morando e ajudando a paroquia até a sua morte. Internado na Santa Casa de Misericórdia, em Sobral, levou um tombo e bateu com a cabeça na testeira da cama, o que o levou a uma cirurgia de cabeça, vindo a falecer em consequência desta cirurgia, no dia 12 de junho de 2004.

Seu velório aconteceu na Matriz de Nossa Senhora de Santana, em Santana do Acaraú e o enterro no cemitério de Ipu, no dia seguinte. Fato curioso é que apesar de não ter nascido em Ipu, era um ipuense fervoroso e por ocasião de sua morte governava a Diocese de Sobral o Pároco de Ipu, Pe. Raimundo Nonato Timbó. O mesmo permaneceu como Administrador Diocesano no período de 07 de junho de 2004 a 03 de julho de 2005, durante o interregno dos Bispos Dom Aldo Pagotto e Dom Fernando Saburido. 

A missa de exéquias foi concelebrada na Matriz de São Sebastião, dia 13 de junho de 2004, as 15h00,  onde o Cônego havia se ordenado há 39 anos atrás e presidida pelo Administrador Diocesano. Realizou a homilia, o Monsenhor Francisco Ferreira de Morais, que, com mais noventa anos, aquela época, teceu paralelos sobre a vida do Cônego e a vida eterna. Mons. Moraes, de formação clerical rígida, pois foi formado no governo de Dom José Tupinambá da Frota, era possuidor do dom da oratória clássica e realizou uma bela homilia exequial.

A capela mortuária no cemitério de São Sebastião, em Ipu, o Cônego mandou-a construir para sepultura de seus pais, seguindo padrão europeu, onde os caixões são enterrados dentro da própria capela. Dispensou, entretanto, o luxo e o uso de materias caros, sendo uma capela desnuda de qualquer suntuosidade e até mesmo austera, entretanto a construção se deu em terreno amplo tendo a frente um  pátio, nos moldes dos patamares das igrejas, onde ele várias vezes celebrou nos dias de finado, após a morte de sua mãe e pai.

 A lembrança da missa de 7º dia, celebrada na Capela do Colégio das irmãs  Dorotéias, em Fortaleza, trás a seguinte inscrição: “A humildade dos simples, a resignação dos fortes, a tolerância dos bons, a fé dos justos. Vencer os obstáculos e ajudar o próximo, estes eram os paradigmas seguidos por nosso querido Pe. Francisco José Aragão e Silva. Será nossa inspiração, nossa saudade eterna, nossa estrela guia. Saudades eternas do seu irmão, cunhada, sobrinhos e amigos. Ao mundo em 20/09/1938. Ao Pai em 12/06/2004.

Coco, Fortaleza(CE), 27 de Dezembro de 2011

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